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Foto do escritorLuiz Primati

CONTOS DE UM FUTURO DISTANTE Nº 7 — 29/03/2022

Atualizado: 1 de abr. de 2022

O plantão de Alessandra Valle recebe um pedido de resgate no mar. Eu, Luiz Primati, trago a primeiro parte de um conto de 2018, publicado inicialmente no Facebook em partes e depois entrou para o livro: "Velhas Histórias Urbanas" que foi baseado num fato. O nome do conto é "O Homem das Duas Caras".


Esse caderno tem a intenção de divertir os nossos leitores que, sempre acabam tirando algum ensinamento para suas vidas.

Leia, Reflita, Comente!


https://br.depositphotos.com/


NÃO É NEUROSE, É REAL


por Alessandra Valle


Amanheceu e a intensidade do sol já se fazia sentir.


Enquanto me arrumava para o trabalho pensei que o dia de praia estaria garantido para aqueles que gostam, mas não para mim.


Há mais de doze anos não mergulho no mar, desde que comecei a investigar casos de desaparecimento de pessoas.


Como não sei nadar com destreza procuro manter o respeito pelo mar, tenho medo de morrer afogada e meu corpo nunca ser encontrado.


Não se espante, é isso mesmo, policiais podem desenvolver diversos tipos de neuroses, mas tenha certeza, são mecanismos de defesa psíquica para tentar manter a sanidade diante de tanto sofrimento com os quais precisamos lidar diariamente.


Naquele sábado de sol, fui trabalhar querendo, na verdade, ir à piscina. Pensei no drink frutado que gostaria de tomar e nas companhias com as quais gostaria de estar. Entretanto, precisava cumprir meu dever e seguir.


O plantão na “Desaparecidos” estava calmo, apenas alguns telefonemas para sanar dúvidas e orientar pessoas angustiadas.


No meio da tarde, uma mulher com trajes de banho adentrou e muito nervosa comunicou o desaparecimento de seu namorado.


— Fomos à praia logo ao amanhecer, como diariamente fazemos. Meu companheiro é nadador desde a infância, chegou a competir desde a adolescência até a fase adulta. Ele está idoso, mas sabe nadar, entrou no mar e depois de algum tempo não saiu – falou a mulher chorando.


Busquei um copo de água para a distinta senhora e perguntei se havia contactado o resgate marítimo do Corpo de Bombeiros Militar e ela respondeu afirmativamente, acrescentando que as buscas ainda continuavam.


Realizei pesquisas de praxe através dos bancos de dados disponíveis à polícia e contactei o Instituto Médico Legal da área onde ocorrera o desaparecimento, mas nenhum cadáver com as caraterísticas físicas do desaparecido fora encaminhado para perícia naquela manhã.


Após a confecção do registro de ocorrência policial solicitei à comunicante toda a calma que pudesse ter, pois, diante de um caso como esse, apenas nos resta aguardar que o corpo possa ser encontrado e resgatado.


Para desabafar, a mulher me confidenciou:


— Eu não pude me despedir. Levamos anos como amantes, até que ele se divorciasse da esposa. Estávamos completando as dicas de viagens de um livro que ficava sob a mesa de centro da sala da casa dele. Não quero nada material dele, apenas esse livro. Você consegue esse livro para mim? Temo que a família dele não queira me dar.


Todas as diligências que poderiam ter sido feitas quanto à confecção do registro policial de desaparecimento já haviam sido realizadas, entretanto, diante de um pedido afetuoso eu não poderia ficar inerte. Afirmei que tentaria falar com os familiares do desaparecido para que o livro de viagens fosse entregue à saudosa namorada.


Os dias se passaram, familiares deste desaparecido comparecerem à delegacia, mas se manifestaram negativamente quanto ao pedido da namorada. O livro nunca lhe foi entregue, assim como o corpo de seu amante nunca foi devolvido pelo mar.


Tenho muito respeito pelo mar até agora.



O HOMEM DAS DUAS CARAS

por Luiz Primati


CAPÍTULO 1 — O IRMÃO QUE HÁ EM MIM

DIZER QUE ALGUÉM tem duas caras sempre foi uma forma de xingamento. Pessoa falsa, mau-caráter, pouco confiável. Edward Mordake foi apelidado de duas caras e a história é bem triste.


No dia em que Rebeca deu à luz ao primeiro filho, Donald largou o que estava fazendo e ficou ao lado da esposa por todo o tempo. O médico do condado de Berkshire chegou o mais rápido que pode. Sorte não ter sido requisitado pela residência real do Castelo de Windsor. Donald ficou grato pela disponibilidade. Rebeca sentia as dores do parto fazia quase 24 horas. Estava na hora do nascimento.


Quando o Dr. Smith começou a retirar a criança de dentro de Rebeca, a princípio, anunciou serem gêmeos. Mas logo se arrependeu e se horrorizou. Corrigiu dizendo ser um menino. Não compreendeu o que acontecia. Seus olhos cansados deveriam estar vendo coisas. Eram duas cabeças, isso ele tinha certeza, no entanto, não eram duas crianças. Tratou de pegar a criança e entregar para uma ajudante que sempre o acompanhava. Pediu para ela não comentar. Sarah não entendeu. Ela fez com que o pequeno bebê chorasse. Pegou a criança e limpou seu corpo do sangue da mãe. Dr. Smith terminou os procedimentos e logo pegou a criança para examiná-la melhor.


Por norma o médico dá a criança para ficar próxima da mãe. Afinal, eles ficaram unidos por 9 meses e esse contato inicial, além de aquecer o bebê, vai transferir bactérias para ele, mas são para o seu bem. Vão formar a flora intestinal do bebê e outras coisas mais. Só que o Dr. Smith não deu a criança para Rebeca. Seu exame foi demorado o que preocupou o casal.


— Algo errado com meu filho? — questionou Donald.


— Meu filho está com algum problema? Não chorou o suficiente? — falou Rebeca apavorada.


— Não é nada disso. Apenas estou examinando a criança.


Os pais ficaram apreensivos. Dr. Smith enrolou a criança numa manta e colocou sobre a mãe. Recomendou à Rebeca para mantê-lo imóvel, apenas para sentir o calor do corpo da mãe. Chamou Donald para uma conversa em particular.


— Dr., se é devido aos seus honorários, amanhã mando levar em dinheiro lá na sua casa — disse Donald preocupado.


— Não é nada disso. É algo muito mais sério — falou Dr. Smith com uma das sobrancelhas arcadas.


Donald ficou ainda mais apreensivo. Dr. Smith, continuou calmamente. Com cuidado na voz.


— Preciso que o Sr. mantenha a calma. O momento é difícil. Vocês vão superar. — Dr. Smith, enquanto falava com Donald, olhava fixo em seus olhos, como se fosse uma cobra hipnotizando sua presa.


— Estou ficando assustado. O Sr. poderia ser mais direto? — pediu Donald.


— Seu bebê, nasceu perfeito, exceto pelo fato de ter nascido com Diprosopia.


Donald olhou o Dr. com cara de muitas interrogações. Smith prosseguiu.


— Diprosopia é quando um bebê nasce com duas faces. Fetos malformados se fundem durante a gestação e a criança tem uma face adicional. Às vezes lado a lado e, em certos casos, com a outra face na nuca. O seu filho tem a segunda face na nuca. Sinto muito.


Donald não acreditava em que ouvia. Balançou a cabeça como se espantasse nuvens imaginárias. Precisava ter certeza de que tinha os pés no chão. Após raciocinar, voltou a falar.


— O Dr. está querendo dizer que meu filho nasceu com problemas mentais?


— Claro que não. É apenas uma deformação genética. Depois que ele crescer um pouco mais fazemos a remoção cirúrgica da segunda face.


Donald ficou triste por Rebeca. Seu sonho era ter um filho e com certeza, não estava nos planos dela ter um filho geneticamente modificado. Tinha que ajudar a esposa a vencer esse primeiro dissabor. Naquela noite Donald faria de tudo para que Rebeca não percebesse a deformidade de Edward, nome escolhido há meses. O parto foi exaustivo e ela precisava recobrar as forças. A primeira mamada não seria de Rebeca. A fidalguia inglesa tinha suas próprias amas de leite. As mulheres não queriam que seus peitos caíssem por isso Donald chamou Ashley.


— Donald, deixe eu ficar um pouco mais com meu filho… — sussurrou Rebeca.


— Meu amor, você está exausta. Precisa descansar. Edward vai precisar muito de você amanhã. Descanse agora.


Rebeca concordou a contragosto. Ashley logo chegou e levou o pequeno Edward para fora do quarto. Donald beijou a esposa na testa e a cobriu. Jaclyn, a outra serviçal ficou ao lado de Rebeca até que ela pegasse no sono. Donald precisava ver como Edward e Ashley estavam se saindo. Foi até o quarto da amamentação. Lá encontrou a ama de leite com a cara muito assustada. Parecia ter visto um fantasma, ou vários.


— O que foi que aconteceu Ashley? — perguntou Donald entrando no aposento.


— Senhor, o seu filho…


— Eu sei, eu sei. Edward teve um pequeno problema na sua formação.


— Mas senhor, o seu filho nasceu amaldiçoado… — falou Ashley com medo e com cautela.


— Nunca mais repita isso. Ouviu bem? — falou Donald asperamente. — Edward será o meu herdeiro e um dia o seu patrão. O Dr. Smith removerá a face que está na nuca assim que ele se desenvolver um pouco mais.


Ashley abaixou a cabeça em sinal de respeito. Esfregava as mãos nervosamente no avental branco. Donald pegou o filho pela primeira vez no colo. Imediatamente olhou a nuca do bebê e lá estava uma face sem vida. Era assustadora. Donald sabia. Mas seria por pouco tempo.


— Agora faça o seu trabalho. Amamente a criança — falou Donald duramente e saiu da sala, entregando antes, Edward para Ashley.


Não foi fácil para Ashley amamentar o pequeno Edward. Parecia que a outra face morderia seus dedos se segurasse Edward pela cabeça. Para resolver isso enrolou o bebê numa manta, deixando apenas a cabeça para fora. Dessa forma conseguiu amamentar o bebê durante aquela noite.


Todos acordaram ainda exaustos na manhã seguinte. Donald teve uma noite péssima. Teve dificuldade em pregar o olho. Como diria para Rebeca sobre Edward? Como ela reagiria? Fazia hora na sala para não ter que encará-la. E nem foi preciso aguardar muito.


— Aiiiiiiii! — Um grito soou pela casa. Vinha do andar de cima.


Donald subiu as escadas em uma passada, correu para o quarto onde estava Rebeca. Ao invadir o aposento, Rebeca olhava para o bebê horrorizada. Ashley segurava Edward assustada. Jaclyn tentava acalmar Rebeca.


— O que foi isso? Aconteceu algo? — falou Donald perturbado.


— Meu Edward… Meu pequeno Edward. Nasceu amaldiçoado — balbuciou Rebeca.


— Não fale uma coisa dessas nunca mais. Nenhum bebê pode ser amaldiçoado. São criaturas divinas, enviadas por Deus. Deveria ter vergonha de proferir tais palavras — falou Donald como se pregasse numa igreja. Sua formação anglicana o fazia ter a mente ampla e aberta. Tudo era para melhorar a vida das pessoas. Jamais pensaria que Edward veio ao mundo para causar a discórdia.


— Ele tem a cabeça deformada… tem dois rostos… — falou Rebeca, olhando assustada para Edward.


Donald se aproximou de Edward. O olhou bem, pegou no colo e o abraçou. Todos no recinto olharam para o gesto sem falar nada. Estavam paralisados com o amor que Donald emanava no ambiente.


— Olhe Rebeca. É nosso filho. O que tanto sonhamos. E ele é lindo. Pegue-o! — Donald ofereceu o pequeno bebê para a esposa. Ela ainda estava em choque. Com a ajuda e insistência do marido, pegou Edward no colo.


— O Dr. Smith disse ser temporário, não disse Sr. Donald? — falou Ashley tentando ajudar a desmanchar o clima ruim que pairava no ar.


— Ele disse sim, Ashley.


— Temporário? Como assim? Edward vai morrer? — falou Rebeca quase num tom desesperador. Quase todos riram.


— Não é isso meu amor. Daqui a alguns meses o nosso Edward poderá passar por uma cirurgia para remover a segunda face. Além disso, essa segunda face não tem função. Foi apenas uma deformidade genética.


Lentamente Rebeca foi se acostumando com a segunda face de Edward. Afinal o bebê não tinha culpa de ter nascido dessa forma. Se alguém tinha culpa ali era ela — pensava. Não conseguiu gerar uma criança saudável. Donald não concordava. Foi desejo de Deus — dizia. Iriam aceitar com resignação e logo Edward estaria bem. Era só aguardarem 3 meses e Edward estaria perfeito com a cirurgia.


* * *


As estações avançavam enquanto Edward crescia. Aquela face na nuca não o incomodava, pois, ainda não tinha a real dimensão do peso que teria quando conhecesse outras pessoas. Jaclyn e Ashley já estavam deveras incomodadas. Quando o pequeno Edward dormia de bruços, os olhos na nuca pareciam segui-las pelo quarto. Era uma sensação horrível. Ashley pensou em pedir dispensa, tamanha era o clima dentro daquele quarto. Quando Rebeca não estava olhando, Ashley colocava um gorro na cabeça de Edward por mais calor que fizesse lá fora. Era a única maneira de não se sentir vigiada.


Finalmente chegou o dia que todos aguardavam. Donald e Rebeca marcaram viagem até o centro da cidade. Chegou a carruagem no horário marcado. Com eles levaram Ashley. Jaclyn acenou da varanda enquanto os cavalos puxavam a carruagem para longe de seus olhos. “Amanhã será um novo dia para todos aqui.” — pensou Jaclyn.


O Dr. Smith tinha seu consultório junto de outros especialistas. Ele era uma espécie de clínico geral. Atendia desde recém-nascidos até idosos na faixa dos 90 anos. Fazia partos, receitava medicações, recomendava especialistas. Era o que todos procuravam para uma primeira opinião. A indicação para a cirurgia foi para o Dr. Brown.


O casal entrou no consultório do Dr. Brown acompanhado de Ashley e Edward. O cirurgião pediu para que Ashley colocasse Edward numa espécie de maca, aonde iria examiná-lo. O pequeno bebê sorria para o Dr. que sorria de volta. Após brincar um pouco com Edward, o virou de lado e passou a examinar a segunda face. Com sua lanterna verificou nos olhos, abriu as narinas com uma pinça, olhou na boca. Depois passou a apertar a nuca de Edward. Chegou a perfurar a pele com uma fina agulha. Depois de 10 minutos já tinha o diagnóstico.


— E então dr. Brown? Quando nosso pequeno Edward será operado? — indagou Donald.


— A cirurgia não oferece riscos ao meu filho? — perguntou Rebeca.


— Custe o que custar, vou pagar todas as suas despesas e honorários — completou Donald.


— Calma senhores. Já vou esclarecer todas as dúvidas — falou Dr. Brown com voz calma.


— O Dr. deve entender nossa ansiedade… Aguardamos por esse momento há quase 6 meses — disse Donald.


— Eu compreendo. Mas vocês também devem compreender o que vou dizer.


Rebeca, Donald e Ashley ficaram apreensivos. Edward ria como se nada estivesse acontecendo.


— A cirurgia para a remoção da face envolve alguns riscos… — disse cautelosamente Dr. Brown.


— Sabemos disso…


— O risco de morte é eminente. A face está ligada diretamente ao cérebro. Não é questão de apenas uma pele adicional em formato de rosto.


Os presentes se entreolharam apreensivos. Dr. Brown continuou.


— O crânio de Edward possui a cavidade dos olhos, da narina e da boca dos dois lados. Remover a face deixará o cérebro exposto. Infecções poderão ocorrer. A sensibilidade ficará aflorada. O risco de morte, como disse anteriormente, é grande.


— E o que isso quer dizer? — perguntou Rebeca apreensiva.


— Isso quer dizer que não vou operar e não recomendo a cirurgia. O melhor é manter Edward do jeito que está.


— O Dr. só pode estar brincando. Aguardamos muito tempo por isso. Não pode nos tirar esse desejo… — esbravejava Rebeca.


— Não estou tirando nada de ninguém. Como médico meu objetivo é salvar vidas e, não operando Edward o estou salvando de um fim prematuro.


— Fim prematuro é o que o senhor está nos sentenciando, negando fazer a cirurgia. O senhor é um covarde! — disparou Donald.


— Por favor, queiram se retirar de meu consultório. Como médico, tenho todo o direito de aceitar ou não realizar a cirurgia e nesse momento é não — falou o Dr. Brown levantando da cadeira e apontando a porta da saída.


— Nós vamos embora. Mas não vamos desistir. Procuraremos alguém com mais coragem que o senhor — disse Donald vociferando. Ashley, assustada, enrolou o pequeno Edward numa manta e colocou de encontro a seu colo. O bebê estava começando a dar sinais de que estava assustado.


Saíram do consultório em passos rápidos, sem olhar para trás. Donald prometeu à Rebeca que procuraria outro cirurgião. Todos seguiram em silêncio de volta para a casa da família.

Edward foi atingindo 1 ano, 2 anos, 3… Donald e Rebeca consultaram muitos especialistas nesses anos todos e eles tinham a mesma opinião do Dr. Brown, operar poderia por fim na vida de Edward. Resolveram se conformar e aceitar. A estratégia passou a ser como explicar para o filho o que ele tinha.


Ashley, inteligente e perspicaz, sempre distraia Edward para que não percebesse a outra face. Usava de gorros, blusas com capuz, mantas. Ela se sentia a guardiã de Edward. Faria o que fosse possível para garantir sua felicidade. No começo Ashley sentia medo. Com o passar do tempo foi sentindo amor por aquela criança. A segunda face não era mais importante.


— Ash, quem é essa criança atrás de mim? — perguntava Edward vendo o reflexo da outra face no espelho.


— Não é ninguém. Vamos brincar… — escondeu a nuca com o gorro e puxou Edward para fora do quarto.


Nem sempre as coisas ocorrem da maneira que queremos. O pequeno Edward já não era tão pequeno. Atingira a idade de 5 anos e os pais tiveram que explicar a ele o que de fato acontecera. Para o pequeno cérebro de Edward era difícil aceitar. O que confortou é o que a mãe lhe disse.


— Era para você ter um irmãozinho. A mamãe teve um problema durante a gestação e seu irmãozinho morreu. Só que ele não queria te deixar e resolveu ficar unido a você. Por isso ele aparece aí atrás de sua cabeça. Entendeu? — explicou Rebeca didaticamente. Edward fez que sim com a cabeça.


Aos 6 anos os pais contrataram um professor de música para o filho. Ele aprendeu a tocar piano. O ensino era longo. Em 9 anos se tornaria um pianista completo. Ele não se preocupava com isso. Apenas gostava de tocar.


Aos 10 anos sofria bullying dos amigos. O chamavam de duas caras. Ele ficava triste. Chegava a chorar escondido nos cantos da casa. Ashley o consolava. Era o seu bebê. Sempre seria. Mas numa tarde, já com 11 anos, pediu para falar com a mãe, a sós.


— Mãe, eu sei que você disse que meu irmãozinho quis ficar comigo, mas eu me cansei dele.


— ?


— Eu quero dizer, quero que ele descanse. Quero tirar ele daí de trás da minha cabeça.


— Entendo perfeitamente o que me diz, mas seu irmãozinho ficaria triste…


— Mãe! Meu irmão está morto. Eu quero me livrar dele! Será que não me entende? — Edward falou enfurecido.


— Calma meu bebê… Vamos ver o que podemos fazer…


— Mãe! Chega de ficar me contando essas histórias… Quero fazer a cirurgia…


— Já tentamos fazer isso. Já te contei. Todos os médicos disseram que é arriscado — falou Rebeca com os olhos cheios d’água.


— Mãe, já se passaram muitos anos. A medicina deve ter evoluído. Quero consultar um médico — implorou.


— Está bem Edward, vamos consultar outro médico. Agora venha aqui e me dá um abraço.


Edward se aproximou da mãe. Ela o abraçou forte. Ele, timidamente. O mais importante é que poderia finalmente se livrar daquela face. Os amigos nunca mais o gozariam.


Continua...




NOSSOS COLUNISTAS


Alessandra Valle e Luiz Primati

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9 comentarios


joanapereira.ft
joanapereira.ft
06 abr 2022

Aiiiiii Não tenho palavras para esta “edição“! adorei os dois! A Alessandra é muito fluida na escrita, leve, lê-se tão bem. Como costumo dizer: escorrega bem entre as goelas 👏🏻 Hihi beijo

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sidneicapella
sidneicapella
29 mar 2022

Luiz, gosto de ler os seus contos! Este conto me fez lembrar do filme “Mãos Talentosas” com Cuba Gooding Jr. Estou curioso para ler o próximo capítulo.

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Luiz Primati
Luiz Primati
02 abr 2022
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Sidnei, você fez falta nesse caderno.

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sidneicapella
sidneicapella
29 mar 2022

Alessandra, gosto muito dos seus contos envolvendo a sua rotina no trabalho. Tem pessoas que nunca vão entender o quanto é importante em se colocar no lugar do outro.

Minha querida Mãe sempre dizia o ditado “O Mar não tem cabelo.”

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Stella Gaspar
Stella Gaspar
29 mar 2022

Alessandra, o mar e seus profundos mistérios. Eu o respeito muito e não confio em suas marés altas. Admiro seus escrever afetuoso acerca de sua profissão, os sofrimentos são vários que te chegam e nem sempre o conforto que o outro espera de ti, é possível.

E o livro? e o corpo?

As reticências da vida darão seus finais ou finalmente. 😍📙


Luiz, sua escrita é hipnotizante, como me prende a atenção. Que drama..., assim acontece em muitos lares, o filho sonhado e as surpresas. Mas amar um filho, esse amor não tem deformações.... continua? 😍👨‍👩‍👧

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Stella Gaspar
Stella Gaspar
02 abr 2022
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🐝🍯😊😍

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Carlos Palmito
Carlos Palmito
29 mar 2022

Alessandra Valle - Infelizmente, no mundo real nem todas ashistórias têm final feliz, algumas, nem vêm um indicio de felicidade, como seria esse livro.


Luiz Primati - Este promete ser bem intrigante, poderia falar mais, mas isso seria dar spoiler a quem vem e vê os comentários primeiro. Aguardo o desenrolar com entusiasmo :)

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Luiz Primati
Luiz Primati
02 abr 2022
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Carlos, além de escrever muitíssimo bem, acha um tempo para ler tudo que publicamos aqui. Obrigado meu amigo! O segredo de escrever bem é ler muito, e estás fazendo as duas coisas com muita perfeição!


😊


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