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Foto do escritorLuiz Primati

CONTOS DE UM FUTURO DISTANTE Nº 14 — 17/05/2022

Alessandra Valle mostra o trabalho silencioso que seu departamento faz, ajudando pessoas; nem sempre sendo reconhecido pelos colegas e pela sociedade. Eu, Luiz Primati, trago a segunda parte de um conto de 2018, publicado inicialmente no Facebook em partes e depois entrou para o livro: "Velhas Histórias Urbanas" que foi baseado num fato. O nome do conto é "A Emparedada da Rua Nova". Ricardo dos Reis nos traz mais um conto e será um colunista frequente de nossa coluna.


Esse caderno tem a intenção de divertir os nossos leitores que, sempre acabam tirando algum ensinamento para suas vidas.

Leia, Reflita, Comente!


https://www.significadodossonhos.inf.br/sonhar-com-guarda-chuva-significados/

PREVENIR É O MELHOR REMÉDIO


por Alessandra Valle


Antes de sair de casa para o trabalho percebi que o tempo estava nublado. "Preciso de um guarda-chuva" — pensei e, preventivamente, coloquei o acessório na bolsa. Durante o trajeto, muita chuva caiu naquela manhã e minha mãe me ligou preocupada: — Filha, está chovendo muito. Você levou o chapéu? Já está a caminho do trabalho? Há anos deixei o lar de meus pais, porém, atenção, zelo e cuidados foram mantidos para comigo. Sinto-me privilegiada de poder ter essa oportunidade de afeto. Reflito muito a respeito da ruptura de laços proveniente do desaparecimento de um parente e, dessa forma, procuro retribuir os cuidados com minha mãe. — Se for sair de casa, não esquece seus documentos pessoais — repito, insistentemente, buscando prevenir o desaparecimento de minha amada. Ao chegar à delegacia, percebi que o plantão estava vazio, concluí que a chuva deve ter atrapalhado o deslocamento das testemunhas e parentes de pessoas desaparecidas. Sempre, entre um atendimento e outro, a caixa de entrada das correspondências eletrônicas é verificada, pois, dezenas de mensagens provenientes de hospitais e abrigos públicos nos são enviadas, diariamente. As solicitações são por referências familiares daqueles que estão internados ou abrigados sem acompanhantes. Muitos não se recordam nem seus próprios dados pessoais, quiçá os contatos dos parentes. Através de buscas e cruzamento de dados inicia o trabalho de prevenção ao desaparecimento de pessoas. Naquele dia chuvoso, verifiquei haver muitas solicitações e logo dei inicio às pesquisas. A primeira, foi de um idoso internado em unidade de saúde de pronto atendimento, cujo nome afirmava ser Paulo e continha apenas a descrição de suas características físicas. Seria quase impossível iniciar as pesquisas com pouquíssimos dados, mas meu pensamento é firme e confiante de que sempre pode haver alguém a sua procura, então, não desanimei e busquei no sistema se havia algum PAULO com registro policial de desaparecimento recente. Para minha surpresa havia apenas dois registros. Ao ler as características físicas de ambos desaparecidos, um foi logo descartado, entretanto, o outro mantinha semelhanças físicas com o internado. Ao ler a dinâmica do evento, percebi que o idoso desaparecido residia em unidade terapêutica pública para terceira idade e havia saído para comprar pão e não retornara. O registro fora feito por uma das psicólogas que trabalhava no abrigo. "Há sempre alguém que sente a ausência, não é preciso que se tenham laços de sangue, bastam os laços afetivos." — pensei enquanto discava o telefone para a unidade hospitalar onde o idoso estava internado. Solicitei uma foto do internado para enviar ao abrigo e assim, confirmar a identidade e a localização do desaparecido. Felizmente, a foto enviada confirmou a identificação de PAULO e, as assistentes sociais do abrigo celebraram com alegria sua localização. Tão logo, se dirigiram à unidade hospitalar para buscá-lo. Indescritível é a sensação proveniente de um encontro de pessoa desaparecida. Prosseguindo com as pesquisas solicitadas, a segunda, foi para um rapaz internado em nosocômio de atendimento emergencial, necessitando de cirurgia e referência familiar para dar ciência e pedir autorização para o procedimento cirúrgico. Ele não tinha identidade no estado do Rio de Janeiro, mas foi possível encontrar o número de seu Cadastro de Pessoa Física — CPF. Não havia registro de seu desaparecimento, entretanto, ao buscar por irmãos verifiquei que uma mulher com mesmo nome de mãe tinha endereço residencial em uma das comunidades da zona sul da cidade do Rio de Janeiro. Ao efetuar contato por telefone com a possível irmã, a moça precisou de apoio emocional, pois seu irmão havia mais de 5 anos que não dava notícias. Ela afirmou que ele havia se entregue à drogadição e passou a residir pelas ruas, perdendo todo e qualquer vínculo familiar. Disse ainda que a mãe, idosa e residente em outro estado, estava depressiva e sofrendo muito com a ausência do filho. Tão logo a informei sobre o estado de saúde de seu irmão, ela compareceu à unidade hospitalar para autorizar o procedimento cirúrgico em seu irmão. Dias depois, recebemos um e-mail da assistência social do hospital com um documento em anexo, era uma foto do reencontro entre os irmãos, ocorrido após a cirurgia ter sido exitosa e de o rapaz recuperar a consciência. Em verdade, o trabalho de prevenção ao desaparecimento de pessoas não tem espaço nos jornais, não traz estatísticas positivas para a polícia e por vezes, nem é reconhecido como atividade policial. Seu resultado não é percebido pelos colegas policiais nas delegacias, pois as pessoas são encontradas antes mesmo da confecção do registro de ocorrência policial de desaparecimento.


Suas consequências também não poderão ser contabilizadas, apenas fará diferença e terá sentido por aqueles que tem a oportunidade de refazerem os laços afetivos.


Quanto a mim, prossigo cumprindo meu dever, prevenindo, pesquisando, informando, criando oportunidades para recuperar vínculos e sobretudo, cultivando os meus laços de afetividade.



A EMPAREDADA DA RUA NOVA

por Luiz Primati

CAPÍTULO II — VIDA A DOIS VIRANDO ROTINA


Os meses se passaram. Marieta e Ana Maria cuidaram dos detalhes do casamento. Escolheram o local, os arranjos, as roupas, os convidados. Herculano cuidou de pagar por todas essas decisões. José achou um local, alugou e arrumou para se parecer com um comércio que era uma espécie de minimercado. Sabia que as pessoas não deixariam de comer. Era uma necessidade.


A cerimônia foi linda. Digna de filmes baratos de Hollywood, mas não importava. Todos em Recife gostavam de festas bregas. Os noivos estavam muito felizes. A barriga ainda não sobressaia. Conseguiu esconder de todos, inclusive das amigas.


Após a lua-de-mel, a vida começou para valer. Passado 5 meses do casamento o filho nasceu. Era uma menina. Deram o nome de Sabrina. Loira, olhos negros, nariz arrebitado. A coisa mais linda que Pedro Paulo conhecera. Sabia que daria trabalho quando crescesse.


Não demorou muito para os anos passarem. Quando se fica atrás balcão de um comércio, correndo para todos os lados, o tempo parece voar mais rápido que o normal. Pedro Paulo trabalhava demais. Gostava do comércio e dava muita atenção para todos os fregueses. Isabela se incomodava com as freguesas. Falava que Pedro Paulo dava atenção demais para as mulheres e sempre respondia:


— Meu amor, 80% dos nossos fregueses são as donas de casa. Tenho que tratá-las bem.


Isabela engolia o argumento de Pedro Paulo para não arrumar uma briga. No fundo, odiava aquela vida. Não era isso que tinha em mente quando resolveu se casar. Com a vida atribulada que levavam, o amor foi esfriando. Pedro Paulo não lhe dava a atenção que precisava. Estava sempre cansado para ela. Isabela ainda estava em forma. Sabrina já ia completar 16 anos e ela sentia-se na flor da idade. Com muito para realizar.


Foi numa sexta-feira, dia que Pedro Paulo ia até o cais buscar peixes frescos que Igor entrou pela porta do comércio. Estava com uma camisa aberta, mostrando seu peito nu e queimado do sol. Os músculos sobressaltavam de suas roupas. Rosto fino e bem delineado. Olhos claros. Cabelo parafinado. Lembrava muito Pedro Paulo quando namoravam. Isabela se encantou pelo rapaz que devia ter os seus 17 anos.


— Boa tarde! Senhora… — cumprimentou Igor.


— Pode me chamar de Bela — disse ao jovem.


— Oi, Bela, onde encontro gelo? Está calor hoje, não é mesmo?


Isabela indicou a geladeira e ficou olhando para o jovem que lhe despertou desejos proibidos de imediato. Sabia que isso era errado. Não conseguia controlar o comichão que se iniciava sob suas roupas íntimas. Logo esqueceu de tudo isso quando Sabrina chegou por trás e a chamou.


— Mãe, me dá um dinheiro para comprar um sapato novo? — falou Sabrina.


— Oi, minha filha. Que susto! Chega por trás da gente como fantasma… — disfarçou Isabela com medo de ter sido pega num momento de fraqueza.


— Então? Vai me dar ou não?


— Preciso ver com seu pai…


— Ele não vai deixar. Diz que tenho mais sapatos que pés e que daria para colocá-los numa centopeia.


Isabela riu. Sabia ser verdade e que esse vício a filha herdara dela.


Igor se aproximou com o saco de gelo nas costas.


— Ora, ora. Quem é essa garota mais linda? Será que aqui é um local onde as princesas se reúnem? Preciso frequentar esse mercado mais vezes… — galanteou Igor.


Sabrina olhou Igor de cima a baixo. Era o seu número. Ficou toda lisonjeada com as palavras dele. Isabela também se encantou pelo rapaz e chegou a ter ciúmes da filha. Tão logo recobrou a sobriedade tratou de espantar tais pensamentos. Não podia disputar a atenção de um jovem que tinha idade para ser seu filho.


— Me chamo Sabrina. Posso saber o seu nome?


— Igor! Prazer — beijou-lhe a mão em forma de galanteio. Sabrina corou imediatamente. Isabela olhou com inveja. — Pode cobrar a minha conta, senhora?


Por um momento Isabela pensou em dizer que hoje era por conta da casa. Não demorou nem um segundo para se arrepender desse pensamento e imaginar todas as consequências desse ato impensado e logo falou:


— São 5 reais. Pode pagar depois se quiser.


— Não gosto de ficar devendo. Aqui estão os 5 reais — pagou Igor. — Obrigado.


Igor tratou de sair dali rapidamente. Foi-se, mas sempre olhando para trás e mirando Sabrina nos olhos. Parecia ser amor à primeira vista, ou apenas desejo de adolescente.


— Menina, deixe de arrastar canto de olho para esse menino. Conheço bem esse tipo. Só querem se aproveitar das garotas de sua idade.


— Chi, mãe. Deixa-me ser feliz — saiu brava para o fundo do mercado que se conectava com a casa deles. Moravam em cima do comércio.


Isabela ficou ali no balcão refletindo sobre o ocorrido. Sabia que não devia ter sentimentos por Igor, adolescente ainda. As coisas que sentia eram bem fortes. Mais intensas do que foi com Pedro Paulo. Precisava ir à igreja e pedir para Nossa Senhora do Carmo livrar sua mente desses pensamentos pecaminosos. Foi isso que fez quando Pedro Paulo voltou do cais com os peixes.


— Que bom que chegou. Estou indo até à paróquia de Santo Antônio — tirou o avental, ajeitou os cabelos e foi-se.


— Espere um pouco Bela. Que pressa é essa? — questionou Pedro Paulo!


— Preciso orar e pedir perdão pelos meus pecados — gritou Isabela em tom irônico.


— Pecados? Vixe! Que diabo de pecados são esses?


Isabela nem se deu ao trabalho de responder aos questionamentos do marido. O que sentia não era normal e quem sabe a santa pudesse ajudar?

* * *

O trabalho no comércio era bem puxado. A rotina começava logo as 5 da manhã quando o sol ainda estava acordando. Pedro Paulo descia no minimercado para arrumar os produtos nas prateleiras. Logo as 6 chegavam os caminhões com as entregas de legumes, frutas, verduras e carnes. O peixe ele preferia pegar às sextas no cais do porto.


Depois que se casou, raramente Pedro Paulo voltou para as praias onde conhecera Isabela. A rotina do dia a dia o deixava cansado e tudo que queria ao chegar em casa era janta, banho e cama. Exatamente nessa ordem. Sexo ficava fora da lista. Quando se animava, Isabela estava naqueles dias ou com dor de cabeça. Um amigo de Pedro Paulo sugeriu marcarem para namorar num calendário e no dia marcado nenhum dos dois poderia arrumar desculpas, mas era ele que não queria.


Herculano, seu sogro, não o deixava em paz. Nem depois que se casou com sua filha. Sempre chegava de supetão na casa dele ou no comércio, falando em voz alta. Fazia comentários jocosos, frases desagradáveis: “E como está a vida de trabalhador?”, “Na faculdade estaria fumando maconha.”, “Minha filha gosta do bom e do melhor, por isso trabalhe duro.”, “Se estivesse numa faculdade, onde eu encontraria frutas e legumes frescos? E, além disso, com esses preços? Nunca!”.


Pedro Paulo tinha que engolir a presença de Herculano constantemente. As frutas e legumes que o sogro levava, jamais pagara um tostão. Pedro Paulo nunca teve coragem de cobrar. Herculano era uma assombração em sua vida. Nas poucas vezes que transou com Isabela depois que ela teve a filha, quando estava sobre ela, em vias de chegar ao prazer absoluto, via a cara de seu sogro dizendo: “Está bom? A minha filha é boa de cama? Seu vagabundo!”. Isso fazia com que Pedro Paulo broxasse na hora e arrumasse uma desculpa. Isabela não entendia e ficava frustrada. Pedro Paulo tinha vergonha de comentar com a esposa que seu pai o assombrava.


Isso poderia explicar o fogo que ardia em Isabela. Com tão pouca idade, pouco mais de 30, os hormônios ainda fervilhavam dentro dela. Não tinha culpa de ter engravidado tão jovem. Pedro Paulo poderia ter evitado. Ela também, sabia disso. Não ia interromper sua vida devido a Pedro Paulo. Ainda o amava e tentava se satisfazer com ele. Com a constante recusa do marido, precisava saciar seus prazeres e, ao mesmo tempo, se culpava por pensar nos desejos da carne. As orações para a santa acalmavam seu coração no momento em que estava na igreja. Ao sair, parecia que o diabo soprava em seu ouvido palavras que a faziam repensar a sua fidelidade.

* * *

Igor virou frequentador assíduo do minimercado. Sabrina era muito atraente. Ele nunca namorava sério, apenas curtia com as garotas. Sabrina tinha um “que” de mistério que o fazia sempre voltar ao minimercado. Muitas vezes nem sabia o que fazia lá e quando menos esperava estava observando Sabrina pelo canto do olho. Isabela percebia o flerte entre os dois. A filha não era boba. Sabia que Igor a observava. Quase que, diariamente, cruzavam olhares, até que Igor convidou Sabrina para uma praia no final de semana.


— Seu nome é Sabrina, não é mesmo? — perguntou Igor.


Sabrina estava no caixa aquele dia. Sua mãe fazia a unha na manicure. Igor aproveitou para jogar a isca.


— É isso mesmo. Como sabe meu nome? — perguntou Sabrina corando em seguida.


— Todos sabem seu nome por aqui…


— Todos? Nossa, que importante eu sou. Não conheço quase ninguém. Só vou de casa para a escola, da escola para aqui no caixa e depois para casa.


Sabrina apenas fazia charme. Ela sabia que os garotos falavam dela, pelos becos. Gostava de ser paparicada.


— Pois é… Queria saber se está a fim de curtir uma praia no domingo lá em Boa Viagem — falou Igor na lata.


— Boa Viagem? É longe…


— Pego o carro do meu pai. Levamos apenas meia hora. Topa?


— Não sei se meus pais deixam… — Sabrina fazia charme.


— Passo aqui às 10h da manhã. Nem vou buzinar, nem nada. Se não aparecer em 10 minutos compreenderei e irei sozinho. Tchau gata.


Igor pagou pelas compras e deu uma piscada para ela. Saiu sem olhar para trás. Sabrina parecia não acreditar ser com ela que Igor estava flertando. Já se sentia apaixonada e sabia que os pais iriam proibir de ir à praia com Igor. Precisava pensar em algo.

* * *


No dia combinado, domingo, as 9:50h, Sabrina estava pronta para ir para a praia com Igor. Disse aos pais que ia com uma amiga e essa amiga, Arléte, antes mesmo das 10h estava na casa de Sabrina.


— E quem é essa sua linda amiga? Nos apresente, Sabrina — disse Isabela com ar de desconfiança. As mães têm sexto sentido. Parece que já vem de fábrica com esse atributo instalado.


— Minha mãe, essa é Arléte.


— Prazer senhora Isabela — Arléte apertou a mão.


— Meu pai, minha amiga Arléte.


— Muito prazer — apertaram as mãos também em sinal de respeito.


Os quatro estavam em silêncio na sala de estar, gerando um mal-estar entre eles. Pedro Paulo quebrou o silêncio.


— Então vocês vão para a praia… sozinhas… posso saber em qual praia será?


— Ainda estamos resolvendo pai. Não será muito longe. Tenho que voltar cedo para fazer as lições do colégio.


— Então vá logo minha filha para não voltar tarde. Os bondes passam de hora em hora. Melhor se apressarem. São 10:05h. O bonde sempre se atrasa alguns minutos — falou Isabela solicita.


As garotas se levantaram rapidamente se apressando para sair. Pedro Paulo pegou Sabrina pelo braço.


— Esperem! Vocês devem tomar cuidado com os garotos. Existem muitos na praia querendo se aproveitar de garotas inocentes — falou Pedro Paulo com medo do que poderia ocorrer.

— Pai, já tenho 16 anos. Sei me cuidar.


As garotas saíram rápido antes que os pais de Sabrina se arrependessem de terem consentido o passeio. No fundo Pedro Paulo relembrava o dia que convenceu Isabela a entrar numa barraca com ele e ali mesmo tirou sua virgindade. Temia que o mesmo poderia ocorrer com Sabrina.


As garotas chegaram à rua já eram 10:11h. Viram um carro virando a esquina. Imaginaram que pudesse ser Igor cumprindo o combinado. Sabrina conhecia o bairro como ninguém e pegou um atalho. Sabia como interceptar o carro logo a frente.


Lá estavam as garotas na esquina, ofegantes, mas à frente do carro que lentamente chegou no local. Fizeram sinal com as mãos. Era Igor e logo reconheceu Sabrina. Parou o carro e abriu a porta para as garotas entrarem.


— Sabrina, que surpresa! Quem é essa sua amiga? — questionou Igor com um sorriso nos lábios.


— Essa é minha amiga Arléte. Estuda no meu colégio.


— Muito prazer Arléte — Igor olhou para trás e mirou a amiga nos olhos. Arléte se encantou na hora. Igor era cativante. Sabrina ficou enciumada.


O caminho para a praia de Boa Viagem foi tranquilo e alegre. Conversaram muito, trocaram ideias sobre o mundo. Sabrina estava radiante. Sentia-se liberta.


Ao chegarem à praia, Arléte cumpriu o combinado com a amiga e foi se refrescar no mar. Sabrina ficou junto de Igor. Era o que sonhara para aquele momento.


— Sá, posso te chamar assim? — falou Igor com voz doce, querendo criar intimidade.


— Claro que pode Igor… — riram.


Os dois ficaram de roupas de praia, ele de shorts, ela de biquíni. De mãos dadas entraram correndo na água fria do mar. Lá jogaram água um no outro, se agarraram com brincadeiras até que os lábios se encontraram. Igor beijou Sabrina de leve nos lábios. Sabrina aceitou o beijo. Igor tentou algo mais íntimo, mas Sabrina se desvencilhou.


— Estou com frio. Vamos sair?


Sabrina nem esperou pela resposta de Igor e quando ele se deu conta Sabrina já estava na praia, ao lado de suas roupas. Tratou de se vestir.


— Sabrina, um amigo meu nos cedeu uma barraca para nos aquecermos. Venha! Vamos ficar quentinhos. — Igor pegou Sabrina pela mão e a conduzia até a barraca.


— Nossa, que quente aqui dentro — Sabrina se abanava sentindo a temperatura.


— Eu também estou sentindo um calorão. Podemos tirar nossas roupas para nos refrescar — disse Igor em meias verdades e meias cantadas.


— Não sei se devo… — falava Sabrina timidamente.


Igor nem falou palavra. Abraçou Sabrina. Beijou-a novamente. Dessa vez com mais intensidade. Logo estava despindo Sabrina. Em alguns minutos estavam sobre o colchão de água. Nem é preciso dizer que a cena de Pedro Paulo e Isabela se repetia ali. Sabrina era virgem ainda e Igor, com jeitinho, conseguiu fazer aquele dia se tornar mágico e pouco doloroso.


Depois que os pombinhos saíram do ninho de amor, encontraram Arléte, brava e irônica.


— Lá dentro estava gostoso? Papai Noel apareceu? Vocês riam tanto que acreditei ser algo muito engraçado que havia lá dentro.


Igor e Sabrina olharam para a cara de Lelé, apelido que Sabrina dera à Arléte e riram muito.

— O que foi agora? Alguma travessura? Tenho cara de palhaça?


Quanto mais Lelé falava, mais o casal ria e a irritava.


Foi um domingo agradável. Todos se divertiram. Os pais de Sabrina nem desconfiaram. Igor continuou a frequentar o minimercado e sempre olhando lascivo para Sabrina que retribuía o olhar. Em dias que os dois podiam, encontravam-se e beijavam-se apaixonadamente.


Como dizem os antigos, a história se repetia. Sabrina e Igor consumaram a relação apenas uma única vez. Depois de 2 meses sem menstruar, já podem imaginar o que aconteceu. Será que Sabrina estava fadada ao mesmo destino de sua mãe? Igor poderia ser estar vivendo a história de Pedro Paulo 16 anos depois? Só o futuro diria.

Continua...




O ENTRAVE

por Dos Reis

Eu admito. O problema para mim, é que não suporto futebol. Sempre amei as artes: música, cinema, teatro… considero o futebol o maior circo armado para o povo, um show de ilusionismo manipulado por grandes empresários que conseguem dar o status de semideuses para aqueles pobres analfabetos que correm entre as quatro linhas. Volta e meia aparece algum intelectual como o Sócrates, mas está cada vez mais difícil. Por isso nunca aceitei que nenhum dos meus filhos entrasse nessa armação, mas... o meu Paulinho não larga uma bola. Ele tem apenas oito anos e faz parte do time juvenil da escola e eu sou o seu maior torcedor, mas eu torço contra, é claro. E espero que ele nunca perceba.


Embora ele tenha se desenvolvido como um jogador defensivo de qualidade, capaz de alimentar o setor ofensivo nos três pontos de ataque, ele não é atlético o suficiente para ser jogador. Isso alentava o meu coração, era apenas fogo de palha, que logo passaria. Além do mais quem joga na defesa tem carreira curta, fica despercebido até pelos narradores de futebol e carregam a culpa de toda derrota. É uma função muito ingrata. De minha parte eu sempre procurei organizar passeios, exatamente, nos dias de jogo. Comprava novos jogos de videogame no meio da temporada para que ele tivesse menos tempo para treinar, fazia feijoada no almoço para ver se ele dormia à tarde… e nada deu certo. A molecada não o deixava em paz, queriam-no no time.


Na final do último campeonato da escola fui assisti-lo. Sentei-me bem na frente, dei tchauzinho e ele ficou empolgadíssimo em me ver ali, assistindo ao jogo. Eu sempre ia, mas ficava do lado de fora, lendo um bom livro.


― Pai, fica vendo.


Dei um sorriso desconcertado. De quem não sabia o que estava fazendo por ali.


― O senhor é o pai do Paulinho?


― Sim.


― Você deve ter orgulho dele.


Eu sinceramente não sabia do que aquele rapaz estava falando.


― Sim, claro que tenho. Como não?


O jogo começou. O meu livro estava no colo para preencher qualquer sinal de monotonia. A tática do time adversário era vaguear ao redor da quadra e causar estragos na defesa, mas o Paulinho estava sempre por ali para desarmar a jogada.


― Muito bem, Paulinho. A torcida gritava.


Até agora, nesse campeonato, o treinador tinha evitado que o Paulinho subisse além do meio de campo, mesmo quando o time ia mal, mas naquela final o jogo não saía de um zero a zero lamentável. Parecia que só um milagre evitaria os pênaltis.


― Paulo, pode subir ― gritou o treinador.


Sem hesitar, Paulinho pegou a bola ainda no setor defensivo e subiu para o ataque, driblou o primeiro e levou todo o resto do time adversário à bancarrota. Fez uma subida espetacular, com toda a arquibancada gritando:


― Vai, Paulo. Vai, Paulo.


Ele deixou, com um toque sutil na diagonal, o goleiro de um lado e a bola de outro. Golaço! A torcida explodiu de euforia e eu querendo me esconder de decepção.


― Onde estava a maldita trave? ― Eu me perguntava. ― A trave caprichosa, a trave poética, a trave que encanta as histórias de todo jogador.


Derrotar o time adversário com um jogador da defesa me parecia uma tarefa demasiadamente assustadora, no entanto… meu medo era que isso forçasse a necessidade do meu filho se tornar atacante. Já pensou? Meu filho deixando de estudar para seguir um time. Dando entrevista na televisão com aquele português grotesco. Cuspindo no chão. Com aquelas “Marias-chuteira” oxigenadas entrando em casa e me chamando de sogro. Aqueles grupos de pagode… Deus… isso precisava ter um fim. Bem que ele podia ter dado um pequeno tropeço. Luxação é coisa simples, correríamos até o hospital e o médico resolveria o problema em poucos minutos.


A arquibancada estava aos gritos. O time o carregava pelos braços. O seu sorriso e a sua atenção era toda minha.


― Pai, o gol é para você.


Eu chorava feito uma criança. Eu, realmente, estava emocionado. O Paulo foi homenageado como o melhor jogador em campo, recebeu uma medalha à parte.


Por enquanto, porém, tudo podia ser apenas um golpe de sorte e quando o Paulo chegou junto a mim, com seu peito cheio de medalhas, eu perguntei:


― Filho, o que você acha do vôlei?



FIM




NOSSOS COLUNISTAS


Luiz Primati, Alessandra Valle e Ricardo dos Reis.

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8 Comments


Luiz Primati
Luiz Primati
May 19, 2022

Contos que encantam, desencantam, espantam. Amo esse caderno e todos os contos aqui publicados!

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sidneicapella
sidneicapella
May 18, 2022

Alessandra, o reencontro harmonioso proporciona uma boa energia. Luiz, O sogrão Herculano, é muito mala! rsrsrsrsrsrs Ricardo, Rachei o Bico, da feijoada para dar sono, rsrsrsrsrs Parabéns colunistas!

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Henrique Soares
Henrique Soares
May 17, 2022

Ricardo, que pai chato esse! Kkkkkk

E de um amor imenso! Rsrs.

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Henrique Soares
Henrique Soares
May 17, 2022

O Pedro Paulo com o trauma de todos os pais: os filhos tomarem os percursos fora do comum como eles. Kkkkkk. E esse ditado: "quem nasce aos seus não degenera" encabula kkkkkk Vamos ver o desenrolar....

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Luiz Primati
Luiz Primati
May 19, 2022
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Pois é... Faça o que eu falo e não o que eu faço!

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Henrique Soares
Henrique Soares
May 17, 2022

Alê, quanto mais leio sobre a sua atividade mais admiro a sua profissão 👏🏽👏🏽👏🏽👏🏽

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Luiz Primati
Luiz Primati
May 19, 2022
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Agora eu quero ver Rick como vai se sair desse desafio da Alessandra. kkkk

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