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Cristo Redentor

IV COPA DE POESIA
BRASIL, OUTUBRO 2022

DIAS 9, 16, 23 DE OUTUBRO E 06/NOV
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Alegria

ALEGRIA MAURO

ALEGRIA MAURO.jpg

Alegria Mauro Manuel, de Angola, formado em engenharia de geologia, participou na antologia angolana N'zila - caminho de sonho e nas antologias brasileiras Encantos Nordestinos, Taverna Poética, antologia Pessoa, cartografia do coração e representa a revista The BARD em Angola.

Instagram: @alegria_mauro11

1 - O PARALELO DA ALMA​​​

O inverno soprava

Varrendo as estradas

E jogando flores ao mesmo tempo

Como nos filmes de romance

Onde entregam-se as almas

E selam os corações pelas causas nobres da alma

 

Soprava também adentro do meu peito

No sentido contrário às forças do universo

Se eu fosse ao norte

Ele soprava para o sul

Se fosse para o leste

Ele soprava para o mar

 

E se eu subisse o cume da montanha

Ele já não mais soprava

Mostrava-se nú aos meus olhos

E eu enxergava-lhe a alma

 

Via o sentido da vida

Escondido no fôlego do vento

E juntamente gravado nas entranhas do tempo

De imediato percebi as linhas paralelas da morte e da vida

Da dor e da alegria

Do ódio e do amor...

Até elas se cruzarem no infinito

Onde termina a vida.

Poesia1

2 - ÁFRICA, ÚLTIMA GOTA DE LÁGRIMA

 

Não sei mais escrever

Nem mesmo compor

Tudo que sinto por agora

É dor que escorre como tinta de caneta

E mata versejate a inocência desse papel virgem e branco

 

A minha própria mãe

Repito

Minha própria mãe

Que gerou-me em seus doces e negros braços

Que por ela, os verdadeiros cotas doaram um pouco e um tanto de si

 

Hoje!

Faz-me bastardo no colo que me abraçou

África minha

Minha mãe

Minha terra

Porque preciso mendigar para comer um pouco do teu pão

Com tanto trigo que banha o teu ventre

 

Porque preciso chorar,

Lacrimejar até a última gota da minha lágrima

Para contemplar a alegria da tua beleza natural

E dos teus maravilhosos mistérios

Se tu és minha mãe!...

 

Teus juízos minha mãe, são amargamente doces

Os cotas que te banham minha mãe

Têm seus desejos e vontades apontados para suas próprias mães

Dizem amar-te com palácios de areia

Enquanto têm castalos de luxo na diáspora

Celebram casamentos em tempos de carnaval

Dizendo jubilemos, jubilemos...

Enquanto viajam em jatos

Só para apertar os seios das moças que desfilam nas ruas de Paris...

 

Minha mãe

Não me maltrates

Sou teu filho que dorme e acorda no teu colo

Dás-me de comer migalhas

Mesmo assim, ainda estou aqui

Meu palácio é bem ali

Verte água, mesmo quando só faz vento

Tu conheces minha mãe

Não lhe peço nada

Senão um pouco de piedade

E uma gota de sangue branco

Para lavar essa bandeira

Como lavamos a 11 de novembro

E outros tantos dias

 

Dão-te anel de barro, dizendo é ouro

Dão-te trapos, dizendo é Pierre e outros cardãs por aí

Dão-te urina dizendo, é água pura PH7

Dão-te um montão de lixo, com marcas de luxo...

 

Minha mãe

Sei que és velha

Mas enxergas

 

Minha voz é só mais um grito

De um tanto de filhos que você gerou

Veja a Somália,

Veja o Sudão,

Veja o Congo,

Veja Angola

E mais outros por aí...

 

Somos feitos filhos de rua, mesmo tendo teto

Não sei dizer ao certo

Se esses cotas, são mesmo os nossos pais

Talvez sejam mesmo, aqueles pais de negros com pele branca

Sei lá mãe,

Não nos parecemos

 

Lhe escrevo essa carta,

Com gemidos na alma

Não sei se ainda viverei

Ou terei mesmo de vender a minha vida,

Só para matar a fome

 

Cultivei o algodão

Mas não me deram roupa,

Estou nú, até na alma

A chuva e o frio não me derretem

Porque Deus me fez de porcelana

 

Falo acorrentado ao pescoço

Com cicatrizes de escravidão nas costas

Minha fonte de lágrima já não jorra mais

Veja os ossos que sobressaiem em mim

E julga tu mesma

 

África

Minha mãe

Minha terra

Teus filhos te esperam!...

Poesia2

3 - UM LIVRO​​​​

Hoje

Vou ser um livro

Vou esfolhar as páginas branca e borradas de mim

Vou deixar-me tocar e ser lido por todos

Mostrar-me-ei ao mundo

Os contos que escrevi, agora podem ler

As poesias que recitei, podem sentir

Os desenhos que borrei, podem contemplar...

 

Leiam tudo de mim

Pois já não as refarei

Talvez só as sentirei novamente

Como o dia que os escrevi

 

Nos contos, que lerem

Minha personagem é a borboleta que deseja voar

Tocar nas flores

E sorrir sem sentir alegria nenhuma

Sei que em breve morrerei

Afinal, é a natureza de nós borboletas

 

Nas poesias

Só a voz de clamor

Que chora quando invocada

Aliás, sou eu a dor de um poeta

Que caminha descalço na estrada da esperança

Cheio de cacus

 

Tu - esses desenhos que vês aí

Eis-me aqui

O traço a lápis partido

Desenhado no canto duma lágrima da mulher que carrega a criança nas costas

E trilha quilómetros até o sol escurecer

Sou eu ali

...

 

Leia-me

Não ao contrário

Mas sim por tudo que mostrou ser

 

Sou um arquipélago de lágrimas

Que se afunda a cada grito

Minha poesia é turva

Meus contos são fuscos

Meu retrato, termina no ponto

Onde o lápis parte.

Poesia3
Poesia4

4 - SAUDADE

Não me parta os ossos

Peço-lhe

Nem mesmo o coração

(Falei para ela...)

 

Se te alegra

Leva a minha mente

E esgota tudo

(Gritei para o escuro...)

 

Faça as tuas vontades fora do meu eu

Não bata tão forte assim

Sabes que agarrei tua mão quando desejaste ir

(Saudade, minha senhora...)

 

Já não tenho medo

Que os dois fujam

Fujam sem levar a mão ao peito

(Levem convosco o vosso amor...)

 

Agora?

No instante que lhe ofereci

Sorriste!

(Bate, bate saudade...)

 

Muito alto

Porque é puro

Leve... E suave

(Ela sabe...)

 

Novamente gritei para o escuro

Mas era um vazio

Que se podia sentir a presença dela

(Sim, dela... A saudade...)

 

Estava lá

As lágrimas a viram

Aquando voava feito vendo

(Se escondendo tão perto...)

 

Não precisa mais

Carregarei sozinho a minha cruz

Sem ferir mais ninguém

(Outra vez falei para o escuro

Para ela...)

A saudade.

5 - UM SEGREDO

 

Após a primavera

Vi realmente que os tempos traem-se um ao outro

O sol é o mesmo

Mas ora decide não brilhar

As estrelas ora decidem se esconder

A lua ora decide desaparecer

 

Depois da primavera

Compreendi que tal como os tempos

O amor pode também nos trair

Fingir amar,

Cuidar

E desejar...

 

No fundo o seu rosto é cheio de rugas

Tem preferências que os olhos da carne não vê

Tem nomes e rostos que a mente desconhece...

 

Depois da primavera

Compreendi que as juras são outra forma de mentir

Mesmo quando se fala a verdade

Compreendi que os desenhos a lápis

Têm uma cor além do carvão

 

A primavera me disse

Aliás, vi ela aquando voltou

Já não era a mesma

Embriagava-se em tudo que é canto

Até nos lugares proibidos

Ela assubiava

 

Primavera

Dessa vez os tempos traíram-te

Já não floresce como as flores do campo

A rosa branca e outras rosas

Deixaste murchar

 

Vejo o teu rosto pálido sem orvalho

Não sei definir ao certo

Se foi o outono

Ou inverno quem traiu-te

 

Talvez seja o teu desejo

Provar outros paladares que brilham

Ou fingem brilhar nos cantos escuros

 

Quiçá!

São segredo dos deuses.

Poesia5
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